ANIMA DECOLORUM EST

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domingo, 28 de fevereiro de 2010

BABAGAMUSH E A PEDRADA PRECIOSA

Não tem jeito. Cinema no domingo à tarde é mesmo um porre, quer dizer, um saco, quer dizer, vários sacos de pipocas infinitas. Não consigo entender essa relação cinema-pipoca. Já a relação TV-pipoca é mais que compreensível. É uma delícia. Então, será possível que as pessoas querem mesmo imaginar que estão em seus sofás, diante de um telão, confortáveis, e se esquecem de que estão em público, e que devem um mínimo de respeito a quem está ao lado?
Faço aqui neste blog uma guerra às Pipocas Infinitas, minhas mortais inimigas. Não, minha querida, você não tem o direito de obrigar o espectador ao lado a escutar aquele barulho irritante do saco de pipoca que parece não ter fundo. O espectador tem direito ao silêncio e à concentração no filme. Mas como isso parece uma tradição idiotamente arraigada na sociedade de consumo de cultura, prefiro procurar horários e filmes ignorados pelos cabeças-ocas que veem uma relação intrínseca entre mastigar como bovino e assistir uma película.
O registro de minhas batalhas contra as Pipocas Infinitas tem alguns momentos hilários, como o que aconteceu quando fui ver Preciosa, de Lee Daniels.
Casa cheia, alguns adolescentes, centenas de sacos imensos das Pipocas, todos fazendo barulho ao mesmo tempo. Comentei o fato para o amigo que me acompanhava, digamos, um pouco alto demais, e as pessoas ao redor se silenciaram para prestar atenção e conferir o que eu dizia. De repente, um clima risível se estabeleceu no espaço, pois todos pararam de conversar para ouvir o barulho das Pipocas Infinitas. Eram tantas que parecia o ruído assustador de uma floresta em chamas. Enfim, começa o filme, e quem insistia em devorar as Pipocas ficou com elas engasgadas na garganta.
É uma pedrada, do começo ao fim. É o fim do Sonho Americano. É a desesperança a 24 quadros por segundo. É a volta dolorosa aos valores mais simples. É uma viagem impressionante.
Preciosa é a história real de Sapphire. Gorda, feia, analfabeta, violentamente hostilizada pela mãe eternamente sentada frente à TV, mãe de uma filha com Síndrome de Down e grávida do segundo filho, ambos gerados pelo próprio pai. A produção é de Oprah Winfrey, e conta com participações de amigos da produtora, Mariah Carey e Lenny Kravitz. Nos papéis principais, a estreante Gabourey Sidibe e a fofa Mo'Nique (Garotas Formosas). Gabourey não precisou interpretar muito para impressionar: obesa quase morbidamente, suas expressões já são patéticas só por causa do excesso de gordura. Mo'Nique é quem impressiona mais: a reação às suas caretas tipicas do gueto novaiorquino vão do asco à profunda revolta. Descontado o exagero romântico desse tipo de filme, como pode existir um ser tão abjeto? Mo'Nique já ganhou uma pá de prêmio nos EUA, Gabourey também, e acho que elas levam a estatueta dourada agora, dia 07 de março. E como se não bastasse, o sorriso de Gabourey na cena final do filme já vale o esforço de aguentar tanta pedrada no estômago por hora e meia.
Ao final, silêncio total. As Pipocas Infinitas haviam morrido na metade do filme. Os cabeças-ocas de plantão ficaram com medo de engasgar. Vitória minha. He he.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Perdi 12 anos de memória

Estou muito triste, hoje. Já tinha perdido nove anos de memória, acabo de saber que estou perdendo mais três.

Acho que escola é, queiramos ou não, o lugar onde somos mais felizes. O aprendizado, a convivência, o fazer coisas diariamente, são dádivas, e a dádiva é, para mim, matéria prima da felicidade, aquela felicidade que se colhe todos os dias, pedacinhos, e monta com eles um grande mosaico de felicidades de todas as cores, ao qual chamamos memória ou, como querem alguns menos românticos, conhecimento.

Pois perdi doze anos de memória. Três edifícios, três lugares onde fui feliz, foram demolidos. Estou me sentindo órfão.

O colégio Anchieta, onde passei da adolescência para a juventude, situado num edifício da década de 30, no Centro de BH, hoje é um imenso estacionamento. A autorização deve ter vindo, claro, dos herdeiros do exemplar educador que criou o colégio, donos do terreno. Grande exemplo de preservação de memória, hein?

Uma parte enorme do prédio que abrigou o Teatro Universitário por dezoito anos está atualmente sendo demolido. O Coleginho, claro, deve ser preservado, pois deve ser tombado. O resto está vindo ao chão. As duas salas onde tive aula, montei espetáculo, ensaiei trabalhos, fiz festa por três anos, estão virando pó, e provavelmente virarão um edifício (a área é valorizadíssima, a dois quarteirões da Avenida do Contorno) ou, ironia, outro estacionamento.

O prédio da faculdade que fiz na década de 90 agora é parte de um buraco ainda maior, e é apenas dez por cento do imenso estacionamento do monstro arquitetônico que é o Expominas, no bairro Gameleira. Não sobrou nada, nem árvore sequer.

Os três prédios, e o montante de felicidade que experimentei ali, agora são só memória. Tenho a impressão de que tem alguém atrás de mim apagando as minhas impressões... Espero que EU esteja deixando impressões nas pessoas.