ANIMA DECOLORUM EST

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quinta-feira, 13 de maio de 2010

BABAGAMUSH EM TERCEIRA DIMENSÃO!

Cinemão de shopping. A batalha se avizinhava. Decidi lutar não lutando, e me dei bem.

Me precavi com armas e estratégias que o inimigo nem suspeitava: estar ao lado dele, com as mesmas armas.

Ou seja, comprei um balde gigante de pipoca e um de refrigerante, mas me sentei na quarta fileira, da tela para o fundo, bem longe da alta concentração das Pipocas Infinitas, pois me misturar a elas já seria ir bem longe na minha "missão suicida".

O preclaro leitor nem imagina o que são as Pipocas Infinitas num shopping popular. São sacos de quilo de batata frita, bandejas quilométricas de esfirras, baldes de bolinhas de chocolate, regados a litros de refrigerante, embalados em sacolas que parecem de celofane, com um acabamento insuspeitado por mim até agora: gritinhos de criança!!

Tudo isso, entretanto, estava distante, na famosa "turma do fundo": as araras, adolescentes ou não, e as famosas Pipocas Infinitas.

Enfim, começa o filme. Hora de colocar os óculos de terceira dimensão, aqueles que forçam seus olhos a fazer o mesmo que eles fazem naturalmente quando você aproxima deles aquelas estampas a princípo estranhas mas que revelam figuras que quase podemos tocar.

Não sei se gostei da experiência. Dá pra ver que todo filme vai ser assim no futuro, mas não sei se isso é assim tão necessário. Parece o mesmo fenômeno do e-book: alta tecnologia, virar-de-página virtual, tudo para se aproximar de um livro de verdade, uma capacidade de armazenamento quase infinita, mas que está longe de parecer um substituto ao ato de pegar um livro e ler. Parece que falta calor, um calor que o cinema 2D já tem e que, pelo menos não tão cedo, não será substituído.

E o filme era Alice no País das Maravilhas, de Tim Burton. O blockbuster de ocasião, produzido pela mega Disney. Super efeitos, super visual (figurinos da irrepreensível Coleen Atwood), roteiro que parece obedecer a cartilha (garantida contra falhas) de Christopher Vogler. Referências explícitas aos dois livros de Lewis Carroll e ao filme de animação, muito (muito mesmo!) de O Senhor dos Anéis (Tolkien) mas idéias novas para dar "frescor" ao que imagino ser imortal e que, mesmo se tivesse sido filmado tal e qual está nos livros, jamais seria perdido.

Os personagens animados (os coelhos, a rata, os cães, o gato, a lagarta, o dragão, o cão-monstro, entre outros) tiveram maior chance de expressão que os atores de carne e osso. Por incrívelque pareça, o trabalho interpretativo que já conhecemos de Johnny Depp e Helena Bonham-Carter, parceiros de Burton já há algum tempo, foi afogado no excesso de efeitos e visuais. Anne Hathaway tudo bem, ela é inexpressiva mesmo. Mia Wichows... Wiborow... Stolichn... Wathever!!, também. Mas, pra quê interpretação, pensando bem? Alice é entretenimento puro, sem grande consistência, uma grande viagem visual, e para um mercado como o americano, isso basta.

Demorei uma hora e meia para terminar o meu balde de pipoca. Agora sei porquê elas são infinitas.

terça-feira, 11 de maio de 2010

BABAGAMUSH E O FANTASMA DE POLANSKI

Roman Polanski terminou as filmagens do roteiro baseado no livro de Robert Harris e foi preso. Daí, saboreando toda essa história, dei de cara com o tal livro na Biblioteca Pública.

Acabei de lê-lo. Fiz isso durante os últimos seis dias, vendo Pierce Brosnan como o ex-Primeiro Ministro Britânico e Ewan McGregor como o escritor. Acabo de ver o trailer no YouTube. Tudo assim, num estalar de dedos, como muitos órgãos de imprensa nos fazem acreditar que seja o ideal de uma sociedade pós moderna.

Eu fico muito admirado de ler um romance escrito assim, com bem pouca linguiça cheia. Aquelas descrições extremamente detalhadas do ambiente em que o personagem está, que matam a gente de tédio e que servem apenas para deixar o livro mais grosso, foram enxugadas ao máximo, para cumprir apenas a sua função primordial, que é criar o clima da cena. O livro de Harris é soturno e sempre em suspenso, como o clima que permeia a maioria das cenas. Livro típico escrito para virar mais um filme de suspense comum nas mãos de qualquer um em Hollywood. Entretanto, a surpresa de cara é com Polanski. O diretor polonês enxergou algo de autobiográfico no livro, o fato de um dos personagens temer os acordos e desacordos de extradição de criminosos entre os países, e viu sua chance de expurgar o imbróglio em que se meteu com uma menor de idade nos anos 70. Seu companheiro de orgia, Jack Nicholson, se safou, talvez por ser americano e apenas um ator. Ele, judeu polonês, diretor de O Bebê de Rosemary, A Dança dos Vampiros, O Inquilino, Repulsa ao Sexo e outras esquisitices, não pôde mais pisar em solo americano. Enfim, Polanski viu no livro a possibilidade de ser melhor que Hollywood. Pelo trailer, acho que conseguiu, o que não é muito difícil.

Escritor-fantasma (ghost-writer, em BOM português) profissional é contratado para fazer a "autobiografia" de um ex-primeiro ministro britânico. Até aí, nada de mais, mas estoura um escândalo relacionado a direitos civis ignorados pelo então chefe de Estado inglês, e o que era uma simples rotina de entrevistas e escrevências se torna jornalismo investigativo. Bem ao clima de outro Polanski, Busca Frenética, estrelado por Harrison Ford. Sabe livro escrito com tinta à base de baba de quiabo, para ser deglutido rápido? Assim, sua ânsia de chegar à solução do enigma passa por cima de quaisquer falhas que porventura haja no caminho, seja de autoria, seja de tradução.

O filme, espero, deve ter algo de inesquecível. Afinal, é um Polanski, e está cercado de suspense com essa prisão arbitrária do polonês em solo suíço que, de repente, fez um acordo de extradição de criminosos (?) com os Estados Unidos, abrindo um precedente perigosíssimo para o até hoje símbolo internacional da neutralidade política. Isso mesmo, acho que a prisão do Polanski, depois de levar às telas um livro como esse, tem um caráter mais político que qualquer outro. Claro, a comunidade internacional está pressionando a Suíça para tirar o véu de confidenciabilidade de seus clientes bancários, e Polanski acabou virando boi de piranha nessa história.

Mexer em ferida dá nisso.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

BABAGAMUSH E A CRÍTICA INÚTIL

Inútil porque o filme já é consagrado, e está quase saindo de cartaz. Mas, mesmo assim, vale o registro de um filme bem tocante.

Hanami é o nome que se dá ao festival das cerejeiras no Japão. A cerejeira dá flor durante uma semana por ano, e é um dos símbolos da transitoriedade de tudo, um dos preceitos básicos do Budismo: a Impermanência. Por isso, os parques de cerejeiras no Japão se transformam em verdadeiras celebrações coletivas durante a floração das árvores.

Trudi, uma senhora alemã mãe de três filhos já adultos, sonha em ver de perto essa e outras maravilhas japonesas, como o Butoh (dança moderna) e o símbolo máximo do país, o monte Fuji.

Só que ela, devotada ao marido, não chega a realizar esse desejo, pois morre antes. O marido, Rudi, é quem realiza esse desejo e, lá no Japão, começa a compreender, pela primeira vez na vida, quem foi sua mulher.

O filme critica abertamente a sociedade alemã, cujos jovens passam um rolo compressor na geração anterior: nunca há tempo, nem paciência, nem assunto, para a convivência. Faço, é claro, um paralelo com o belíssimo A Balada de Narayama, que também versa sobre a transitoriedade da vida e a budística aceitação deste inelutável regra da natureza. Acho, até, que o filme de Nagisa Oshima está nas entrelinhas do de Doris Dörrie, nas quase cerimoniosas referências ao país oriental.

E esta é a resenha inútil de um filme, pois a geração mais nova, que deveria assistir esse filme, está toda no shopping assistindo Alice. A geração mais velha, que deveria estar se divertindo com o filme de Tim Burton está lá, reaprendendo com os alemães e japoneses coisas que já sabiam há muito tempo. Valores inversos. Sei não. Tenho medo de ficar assim.

terça-feira, 4 de maio de 2010

BABAGAMUSH E A POLÊMICA JUDAICA

Talvez este escriba já tenha lido e assistido muita história do amor que não ousava dizer o nome e, como minha memória é imodestamente excelente, guardo todas e, claro, posso citar um monte de grandes histórias contadas em grandes filmes, livros e peças de teatro. Tragédias, dramas e comédias. Tenho a desagradável sensação de que o tema se esgotou, e de que o que se vê nos cinemas é apenas mais do mesmo, alguns filmes contando novas histórias com sucesso e beleza, outros não.
Hetero em casamento tradicionalista e conservador encontra jovem cheio de vida e o contrata como ajudante, e logo passa do balcão da loja para a cama do rapaz. A sociedade pressiona, mesmo sem saber o real motivo de tal ligação, e o moço vai embora, deixando o mais velho desconsolado. O enredo é o mesmo de Outra História de Amor, filme argentino de 1986, com pequenas diferenças.
O que resta de Pecado da Carne, filme israelense de 2009, para que seja um filme belo? Resta o ineditismo da quebra de um tabu religioso pesadíssimo, a existência de gays no seio da comunidade judaica ortodoxa; a força e a coragem dos atores em cena, com sua expressividade extrema nos momentos de maior silêncio; a fotografia e a música; e o interessantíssimo apoio do Conselho Israelense de Cinema, o que vem provar que as instituições daquele país não são tão ortodoxas como eu imaginava...