ANIMA DECOLORUM EST

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terça-feira, 1 de julho de 2008

Quem não tem parâmetro, tem cabresto

Acabo por não achar ruim que alguém tenha cabresto. Infelizmente, o individualismo que, em modestas medidas, é até saudável, em níveis mais abrangentes está provocando o caos nas grandes cidades.
Todos nós trabalhamos para que tenhamos conforto em nossas vidas. OK. O sistema de transporte público em grandes cidades como Belo Horizonte e São Paulo são os piores e mais caros possíveis. Não há treinamento para motoristas, há sobrecarga de trabalho, não há renovação regular na frota, os salários são baixos. OK. O esquema de marketing das montadoras e distribuidoras de veículos aprendeu com o colega da moda: "você tem que comprar o carro do ano, se quiser manter seu status de poderoso" - já falei de poder aqui, não vale a pena repetir. Para estas empresas, quanto mais escoar a produção, melhor. OK. Está mais barato adquirir veículos, os financiamentos estão mais seguros. OK. A indústria da falsificação de carteiras de motorista é uma das que mais crescem no país, e as pessoas não estão se importando muito em não ter formação e, assim como as pessoas honestas, estão ansiosas para fugir do transporte coletivo degradante. OK. A solidariedade é uma das últimas coisas nas quais se pensa. Se o famoso botão do "foda-se" tivesse uma luzinha, ninguém veria a noite. É o império do "primeiro eu". OK.
E aí estão os ingredientes de uma bomba de proporções megatômicas.
Não adiantou a campanha do Dia Mundial sem Carro. Não adiantou o rodízio em São Paulo. Belo Horizonte já está precisando de um, mas já dá pra perceber que não vai adiantar. Não adiantou a campanha pela Carona Solidária. Se prestarmos atenção nos carros parados nos sinais, veremos que poucos têm mais ocupantes além do motorista. Dois veículos estão ocupando o lugar de um ônibus, ou seja, duas pessoas estão empurrando setenta pra lá: "sai que eu sou poderoso". Porta de colégio particular é caso perdido, a menos que se estabeleça uma multa de três mil reais para fila tripla, só mexendo no bolso do cidadão para que alguma atitude civilizada seja cumprida. Em outras palavras: cabresto.
Estou quase desistindo de comprar um carro. Andar de ônibus, metrô e taxi tem resolvido o meu problema, a menos que eu queira, de repente, ir comer naquele restaurante escondido no mato num sábado à tarde. De outro modo, estou com medo de entrar nesse caldo grosso. A tal de Lei Seca é um alívio, mas já deu sinais de que vai adiantar pouco: parece que as pessoas estão mesmo querendo se matar e, se possível, levar com elas um número máximo de pessoas.
Por essas e por outras, acho que chamar nossa sociedade de civilização é dar um valor às atitudes humanas superior ao que elas realmente merecem. Está sendo necessário separar os conceitos de civilização e democracia. Está sendo necessário amarrar cabrestos nas pessoas. É trite? É. Mas qual é a "mensagem" de um cabresto? Um cabresto é um instrumento aplicado para que o cavalo saiba o que fazer. Em outras palavras, somos todos bestas que precisam que a democracia seja autoritária para que saibamos que a convivência em sociedade não pode ser baseada em individualismos.
E vou continuar andando a pé. Não preciso dar seta, não preciso passar marcha, não poluo o ar (exceto quando como batata doce) e ainda queimo calorias. Pra quê temer o inferno? Já estamos criando um aqui mesmo e nos acostumando a ele, ter a alma padecendo em chamas eternas não deve ser muito pior.

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