ANIMA DECOLORUM EST

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segunda-feira, 16 de maio de 2016

O QUE ME CHOCA 17/03

Capítulo 03

A QUESTÃO FISCAL
Isto nos leva a discutir a questão fiscal. No Brasil de hoje a crise fiscal, traduzida em déficits elevados, e a tendência do endividamento do Estado, tornou-se o mais importante obstáculo para a retomada do crescimento econômico. O desequilíbrio fiscal significa ao mesmo tempo: aumento da inflação, juros muito altos, incerteza sobre a evolução da economia, impostos elevados, pressão cambial e retração do investimento privado. Tudo isto somado significa estagnação ou retração econômica. Sem um ajuste de caráter permanente que sinalize um equilíbrio duradouro das contas públicas, a economia não vai retomar seu crescimento e a crise deve se agravar ainda mais. Esta é uma questão prévia, sem cuja solução ou encaminhamento, qualquer esforço para relançar a economia será inútil. Nenhuma visão ideológica pode mudar isto.
Parágrafo condicionante: para o texto, é imperativo o PMDB chegar ao poder (“Ajuste de caráter permanente”) porque ele é dotado da “solução mágica”. O termo “duradouro” é apenas retórica, pois mesmo o pior estudante de Economia entende que equilíbrio fiscal duradouro em um governo é utopia.
Nosso desajuste fiscal chegou a um ponto crítico. Sua solução será muito dura para o conjunto da população, terá que conter medidas de emergência, mas principalmente reformas estruturais. É, portanto, uma tarefa da política, dos partidos, do Congresso Nacional e da cidadania. Não será nunca obra de especialistas financeiros, mas de políticos capazes de dar preferência às questões permanentes e de longo prazo. É também uma tarefa quase heroica que vai exigir o concurso de muitos atores, que precisarão, pelo tempo necessário, deixar de lado divergências e interesses próprios, mesmo que tenham que retomá-los mais adiante.
Mais falácia. O PMDB não está interessado em implantar reformas estruturais. Ele quer a manutenção do que vinha usufruindo até agora. E vem trabalhando para isso. A expressão “conjunto da população”, quando se trata de nomear quem vai arcar com o prejuízo, não quer dizer exatamente TODO MUNDO. Sabe aquela expressão de George Orwell, “Todos são iguais mas alguns são MAIS IGUAIS que os outros”? Pois é. Esses “mais iguais” não sofrerão nada, nem terão seus privilégios arredados em nem um milímetro.
Nossa crise é grave e tem muitas causas. Para superá-la será necessário um amplo esforço legislativo, que remova distorções acumuladas e propicie as bases para um funcionamento virtuoso do Estado. Isto significará enfrentar interesses organizados e fortes, quase sempre bem representados na arena política. Nos últimos anos é possível dizer que o Governo Federal cometeu excessos, seja criando novos programas, seja ampliando os antigos, ou mesmo admitindo novos servidores ou assumindo investimentos acima da capacidade fiscal do Estado. A situação hoje poderia certamente estar menos crítica.
Para aqueles poucos politicamente alfabetizados que observam, desde sempre, os aumentos arbitrários e abusivos em salários de parlamentares e juízes, a expressão “situação hoje poderia certamente estar menos crítica” é óbvia. O governo acaba de vetar novamente o reajuste do Judiciário, o que aumentaria para R$ 36 BI o gasto anual com esses salários. Sem falar nos “auxílio-tudo” que o legislativo e judiciário já recebem e não abrem mão. Esses são os reais “interesses organizados e fortes” de que o texto fala. Agora, dizer que o governo cometeu excesso criando e ampliando programas significa dizer que, para equilibrar as contas, serão cortados esses excessos, e não os salários e benefícios do Legislativo e Judiciário...
No entanto, a parte mais importante dos desequilíbrios é de natureza estrutural e está relacionada à forma como funciona o Estado brasileiro. Ainda que mudássemos completamente o modo de governar o dia a dia, com comedimento e responsabilidade, mesmo normas constitucionais, sem o que a crise fiscal voltará sempre, e cada vez mais intratável, até chegarmos finalmente a uma espécie de colapso.
Parágrafo dispensável pois é uma extensão das falácias do anterior.
Qualquer ajuste de longo prazo deveria, em princípio, evitar aumento de impostos, salvo em situação de extrema emergência e com amplo consentimento social. A carga tributária brasileira é muito alta e cresceu muito nos últimos 25 anos. Em 1985, data da redemocratização, os impostos representavam 24% do PIB. Neste mesmo ano, nos Estados Unidos, a carga tributária era de 26%, um pouco acima da nossa. Na Alemanha, era de 36% e na Inglaterra, 38%. Em 2013, nossa carga tinha saltado para 36% do PIB, enquanto nos Estados Unidos ela baixara para 25%, na Alemanha subira para apenas 37% e na Inglaterra, caiu para 33%. Ou seja, todos os países relevantes e bem-sucedidos mantiveram ou mesmo baixaram os impostos em relação à renda, enquanto o Brasil aumentou os impostos cobrados da sociedade em 50%. A Coreia tem hoje uma carga de 24% e o México, 20%. Isto mostra que chegamos claramente a um limite para a cobrança de impostos. Taxar mais as famílias e as empresas, transferindo seus recursos para o Estado, parece ser algo disfuncional e danoso para a capacidade de competição do nosso setor produtivo.
Usar uma expressão como “Amplo consentimento social” por um partido que jogou 54 milhões de votos no lixo é de um mau-caratismo de calibre grosso. Comparar taxas de impostos entre países com histórias socio-economico-políticas diferentes é ignorar um dos problemas reais do Brasil, que é a cobrança desproporcional de impostos, sendo que os mais ricos pagam bem menos que os mais pobres. Reduzir a sociedade brasileira de pessoas jurídicas à simples palavra “empresas” é ignorar que as micro e pequenas empresas são as que mais geram empregos no país, enquanto as empresas gigantes estão a cada dia automatizando mais seus processos de produção e dispensando empregados.
No Relatório Global de Competitividade 2015-2016, do Fórum Econômico Mundial, publicado recentemente, o Brasil ficou em 75º lugar, entre 140 países, perdendo 18 posições em relação ao relatório anterior, de 2014, sendo ultrapassado pelos emergentes – Rússia, África do Sul, Índia e México, o que mostra que algo muito errado está acontecendo com o nosso país nestes últimos anos. Na decomposição dos fatores que compõem o índice o nível dos impostos e a complexidade tributária, combinados, respondem por 25% – o maior fator – dos problemas para realizar negócios no país. As leis trabalhistas e a corrupção vêm muito abaixo, com 14% e 12%, respectivamente.
Este tipo de retórica faz parecer que o Brasil PRECISA que todas as empresas do mundo venham investir aqui. Será que vai haver espaço para todas, se escancararmos as vantagens tributárias e reduzirmos a necessidade de retorno trabalhista? As grandes empresas já estão no país (algumas delas já sediadas) e estão interessadíssimas em transferir para o exterior o máximo de ganho possível, forçando (através de atos como o do pato gigante da FIESP) uma revisão das conquistas trabalhistas dos últimos 60 anos. Ou seja, mínimo de investimento e retorno para o país “anfitrião”, máximo de lucro a ser transferido para fora.
As despesas públicas primárias, ou não financeiras, têm crescido sistematicamente acima do crescimento do PIB, a partir da Constituição de 1988. Em parte estes aumentos se devem a novos encargos atribuídos ao Estado pela Constituição, muitos deles positivos e virtuosos, na área da saúde, da educação e na assistência social. Nestes casos, o aumento das despesas públicas foi uma escolha política correta e que melhorou dispositivos que tornaram muito difícil a administração do orçamento e isto contribuiu para a desastrosa situação em que hoje vivemos. Foram criadas despesas obrigatórias que têm que ser feitas mesmo nas situações de grande desequilíbrio entre receitas e despesas, e, ao mesmo tempo, indexaram-se rendas e benefícios de vários segmentos, o que tornou impossíveis ações de ajuste, quando necessários. Durante certo tempo houve espaço para a expansão da carga tributária e evitaram-se grandes déficits. Como também houve um certo crescimento econômico que permitiu aumento das receitas fiscais. O crescimento automático das despesas não pode continuar entronizado na lei e na Constituição, sem o que o desequilíbrio fiscal se tornará o modo padrão de funcionamento do Estado brasileiro.
Reforma tributária é necessária e precisa ser antecedida de um debate que envolva todos os implicados no processo produtivo brasileiro. Este parágrafo insinua que deverão ser revistas cláusulas da Constituição que, até onde sei, são pétreas. Outra insinuação presente no parágrafo reforça a ideia de Estado Mínimo. Para mim, no entanto, reduzir despesas governamentais (rubricas do Orçamento da União) devem começar pelos salários e benefícios de todos os três poderes. A economia seria astronômica.
A outra questão da mesma ordem provém da previdência social. Diferentemente de quase todos os demais países do mundo, nós tornamos norma constitucional a maioria das regras de acesso e gozo dos benefícios previdenciários, tornando muito difícil a sua adaptação às mudanças demográficas. Nós deixamos de fazer as reformas necessárias decorrentes do envelhecimento da população nos anos 1990 e 2000, ao contrário de muitos países, e hoje pagamos o preço de uma grave crise fiscal. O resultado é um desequilíbrio crônico e crescente. Em 2015 a diferença ou déficit entre as receitas e as despesas no regime geral do INSS está em 82 bilhões de reais. No orçamento para o ano que vem esta diferença salta para 125 bilhões. As projeções para o futuro são cada vez piores.
Concordo com quase tudo o que se diz neste parágrafo. Entretanto, as regras novas teriam de valer para quem ganha acima de 15 salários mínimos de aposentadoria – será que é de conhecimento geral que um Deputado tem direito a aposentadoria integral após cumprir DOIS mandatos? Temos aí uma quantidade de ex-deputados aposentados antes mesmo dos 50 anos, que receberão seus salários nababescos integralmente pelo resto da vida após ter trabalhado apenas OITO ANOS?
A conclusão inevitável a que se chega é que os principais ingredientes da crise fiscal são estruturais e de longo prazo. De um lado, a falta de espaço para aumento das receitas públicas através da elevação da carga tributária, de outro, a rigidez institucional que torna o orçamento público uma fonte permanente de desequilíbrio.
“Elevação da carga tributária”? “Rigidez institucional”? “Fonte permanente de desequilíbrio”? A solução então, para os correligionários do PMDB, será afrouxar as regras do Orçamento (cuja lei precisa ser promulgada ano a ano) e tacar imposto em cima de quem já paga muito (os pobres, claro: ricos terão isenção e incentivo a torto e a direito) é uma das fórmulas do Milagre?
A solução destas questões não é apenas de natureza técnica: depende de decisão política. Na ausência de uma ação forte e articulada, que conduza a um conjunto de reformas nas leis e na constituição, a crise fiscal não será resolvida e, ao contrário, tende a tornar-se cada vez mais grave. Na constância da crise fiscal a economia vai manter-se estagnada ou com taxas muito baixas de crescimento. No século passado dobramos a renda per capita a cada geração; se persistirmos no ritmo dos últimos 16 anos, vamos precisar de 60 anos para dobrá-la novamente e chegar, aos preços de hoje, a algo entre 15 ou 17 mil dólares, um número medíocre mesmo para 2015.
“Reformas nas leis e na constituição”?Constituição de quê, com letra minúscula?
 A sociedade brasileira ainda está muito distante do padrão de vida das famílias nas economias desenvolvidas. Ao contrário, a maioria absoluta da população ainda sofre de baixo poder de compra e de consumo e mesmo suas necessidades humanas básicas ainda não estão atendidas. Crescer a economia não é uma escolha que podemos fazer, ou não. É um imperativo de justiça, um direito que a população tem diante do Estado.

Este parágrafo é o primeiro sinal de que o mais importante para o PMDB é ter consumidores, e não cidadãos. É o primeiro sinal da existência real do verdadeiro mandatário deste país: o Grande Empresário. Não interessa a saúde ou a educação da população: há a indústria farmacêutica e a TV que provem o remédio e o entretenimento que maquiam, substituem as demandas originais.

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