“Os passos necessários” já são velhos conhecidos – privatização “do que for possível”, redu-ção/fechamento de programas sociais, congelamento de salário mínimo, revogação de direitos previdenciários, etc. Vide abaixo:
RETORNO A UM ORÇAMENTO VERDADEIRO
Verdadeiro? Quem está escalado para averiguar a aplicação do termo?
O primeiro é a reforma da nossa sistemática orçamentária. Na forma como está desenhada na Constituição e nas leis posteriores, que resultam em excessiva rigidez nas despesas, o que torna o desequilíbrio fiscal permanente e cada vez mais grave. É a leitura destas regras que alimenta os prognósticos cada vez mais sombrios sobre o futuro das nossas contas públicas.
Ameaça de calibre grosso e muito, muito preocupante. A meu ver, se as regras que compõem a Lei Orçamentária forem flexibilizadas, o resultado é conhecido: quem tem (terá) o poder de manipular o dinheiro vai fazer o que quer, e quem vai pagar a conta é o camaradinha lá de baixo, que paga seus impostos honestamente. É uma lei conhecida, que eu doravante denomino Lei Paulo Maluf: “roubo, mas faço”. E normalmente fará para quem menos precisa, como naquele caso do túnel em São Paulo construído com dinheiro público no qual só os carros poderiam passar – vetado aos ônibus. É, senhores... a História vive se repetindo.
O orçamento público numa sociedade em que os gastos públicos representam mais de 40% da renda nacional é a principal arena para os conflitos distributivos, onde os diferentes interesses, inclusive os mais legítimos, lutam para se apropriar de maior parcela de recursos. Num país em que o sistema político é visto com desconfiança, os diversos grupos de interesse tratam de esquivar-se das incertezas do orçamento anual, tratando de inscrever na pedra da Constituição as suas conquistas, preservando-as das mudanças nas inclinações políticas ou mesmo das incertezas da conjuntura econômica.
Mais uma aplicação da famosa tabelinha, com destaque para a paráfrase da famosa frase de George Orwell: “todos os interesses são legítimos, mas alguns são mais legítimos que outros”. Além disso, há nas entrelinhas um reforço de ameaça: as conquistas sociais absorvidas pela Constituição serão virtualmente desprezadas/revogadas para se aplicar este programa.
No Brasil, a maior parte do orçamento chega ao Congresso para ser discutido e votado, com a maior parte dos recursos já previamente comprometidos ou contratados, seja por meio de vinculações constitucionais, seja por indexação obrigatória dos valores. Assim, a maior parte das despesas públicas tornou-se obrigatória, quer haja recursos ou não. Daí a inevitabilidade dos déficits, quando os recursos previstos não se realizam, ou porque as receitas foram superestimadas, ou porque houve retração na atividade econômica, e, se concentrando numa parcela mínima do orçamento, o que torna o ajuste mais difícil e menos efetivo. Esta é uma das razões principais porque as despesas públicas tem crescido sistematicamente acima do PIB. Enquanto as receitas também cresciam neste ritmo, a situação parecia controlada. Hoje o aumento sem limite da carga tributária não é mais uma possibilidade!
Hipocrisia de grosso calibre. Não há o menor interesse em manter os tributos nos patamares em que estão: a criatividade dos governos para novos impostos é infinita – a Prefeitura de Belo Horizonte (Márcio Lacerda, PSB) inventou um sobre as placas dos estabelecimentos comerciais. Além disso, mais um reforço nas ameaças: as despesas públicas estão maiores que a receita. Atitude? Cortar despesa!, claro que sem passar pelos salários do três poderes – esses estão protegidos por cláusulas pétreas.
O orçamento é a peça mais importante de uma legislatura. Para este fim é que os parlamentos foram criados no moderno Estado de direito. E assim continua sendo na maioria das grandes democracias modernas. Se quisermos atingir o equilíbrio das contas públicas, sem aumento de impostos, não há outra saída a não ser devolver ao orçamento anual a sua autonomia. A cada ano a sociedade e o parlamento elegem suas prioridades, conforme os recursos e as necessidades. Se houver erro, poderá ser corrigido no ano seguinte e não perdurar para sempre.
Estou aterrorizado com as possibilidades que podem resultar deste parágrafo com hipocrisia calibre canhão. Não haverá Estado de Direito num governo PMDB/Temer. A Presidenta mal saiu e o “moderno Estado de Direito” já está dando mostras a que veio – as baianas presas pela Polícia Federal por se manifestarem contra um parlamentar golpista no avião da TAM. Se fosse um parlamentar de esquerda/petista, elas poderiam ter chegado às vias de fato (agressão física) que a reclamação do parlamentar esperaria meses para obter uma resposta da PF.
Para isso é necessário em primeiro lugar acabar com as vinculações constitucionais estabelecidas, como no caso dos gastos com saúde e com educação, em razão do receio de que o Executivo pudesse contingenciar, ou mesmo cortar esses gastos em caso de necessidade, porque no Brasil o orçamento não é impositivo e o Poder Executivo pode ou não executar a despesa orçada.
Aqui as ameaças recebem seus respectivos nomes: os gastos com saúde e educação serão flexibilizados e aplicados somente quando houver dinheiro, ou seja: nunca. Quem tem a sorte de ter um plano de saúde de primeira e estudar em colégios/faculdades de primeira (os ricos) estarão resguardados, pois afinal é para isso este programa: voltar a selecionar a sociedade.
O orçamento não impositivo, ou melhor, facultativo, é fruto da desconfiança do Executivo na sabedoria ou responsabilidade do Legislativo. Remédio equivocado, para uma doença que se chama falta de articulação política democrática. Os Poderes têm que se entender, e o Executivo sempre dispõe de instrumentos de contenção. O contingenciamento e, o principal deles, o veto.
Altas risadas aqui. Como é possível falar em “Sabedoria e responsabilidade do Legislativo” depois de 17 de abril? Nunca houve, não há e não dá mostras de que haverá enquanto o sistema proporcional não for revisto. Como é possível que o PMDB fale em “articulação política democrática” se ele orquestrou um golpe de baixíssimo nível? Como é possível que o PMDB exorte que “os Poderes Tem que se entender” se o seu próprio modus operandi é o “me obedeçam senão toco fogo nesta birosca”?
Para um novo regime fiscal, voltado para o crescimento, e não para o impasse e a estagnação, precisamos de novo regime orçamentário, com o fim de todas as vinculações e a implantação do orçamento inteiramente impositivo. A despesa orçada terá que ser executada, sem ressalvas arbitrárias, salvo em caso de frustração das receitas, caso em que se aplicarão às despesas um limitador médio, com índices previamente aprovados pelo Congresso podendo ser variáveis, mas produzindo sempre uma redução final suficiente para o equilíbrio, ao longo do ciclo econômico.
Em um jargão próprio do design, a proposta contida neste parágrafo pode ser entendida como Streamlining: uma roupagem nova (novas palavras) para o mesmo conteúdo. O governo atual impõe o orçamento de um jeito. O golpista quer impor o orçamento de outro jeito. Conhece a expressão “seis por meia dúzia”? Pois é. Isto mostra que este programa é recheado de hipocrisia e cinismo em doses cavalares.
Outro elemento para o novo orçamento tem que ser o fim de todas as indexações, seja para salários, benefícios previdenciários e tudo o mais. A cada ano o Congresso, na votação do orçamento, decidirá, em conjunto com o Executivo, os reajustes que serão concedidos. A indexação dos gastos públicos agrava o ajuste em caso de alta inflação. Nunca devemos perder de vista que a maioria da sociedade não tem suas rendas indexadas, dependendo sempre do nível de atividade econômica para preservar seu poder de consumo. A indexação das rendas pagas pelo Estado realiza uma injusta transferência de renda, na maioria das vezes prejudicando as camadas mais pobres da sociedade. Quando a indexação é pelo salário mínimo, como é o caso dos benefícios sociais, a distorção se torna mais grave, pois assegura a eles um aumento real, com prejuízo para todos os demais itens do orçamento público, que terão necessariamente que ceder espaço para este aumento. Com o fim dos reajustes automáticos o Parlamento arbitrará, em nome da sociedade, os diversos reajustes conforme as condições gerais da economia e das finanças públicas.
Deveria ser acrescentada a palavra “alta” na frase “a maioria da sociedade não tem suas rendas indexadas”, mas o ponto central do parágrafo, o detalhe que transforma todo este programa num espetáculo de horror, é o trecho “Quando a indexação é pelo salário mínimo, como é o caso dos benefícios sociais, a distorção se torna mais grave, pois assegura a eles um aumento real, com prejuízo para todos os demais itens do orçamento público, que terão necessariamente que ceder espaço para este aumento.” Tradução pessoal do parágrafo: se o Congresso decidir destinar todo o Orçamento para a compra de novos veículos importados e blindados para os três poderes, nada fará com que um centavo seja destinado a um programa social, como a cultura ou a pesquisa. Tudo estará nas mãos dos parlamentares idôneos e responsáveis que deram um “show de democracia” em 17 de abril.
Em contrapartida a este novo regime, novas legislações procurarão exterminar de vez os resí-duos de indexação de contratos no mundo privado e no setor financeiro.
A cereja do bolo de horror: adeus ao lucro do Pré-Sal destinado à Educação. Tradução livre: “se virem!”
A terceira regra nova do orçamento é a ideia de “orçamento com base zero”, que significa que a cada ano todos os programas estatais serão avaliados por um comitê independente, que poderá sugerir a continuação ou o fim do programa, de acordo com os seus custos e benefícios. Hoje os programas e projetos tendem a se eternizar, mesmo quando há uma mudança completa das condições. De qualquer modo, o Congresso será sempre soberano e dará a palavra final sobre a continuação ou fim de cada programa ou projeto.
Esse “comitê independente”, se tomarmos como base a coerência de ter um coronel em uma Comissão de Direitos Humanos da Assembleia de São Paulo, ou um racista homofóbico evangélico na Comissão de Direitos Humanos e Minorias do Congresso, faço uma ideia de como ele será composto. Um “Congresso soberano” para mim é a máscara do Jason no filme “Sexta-Feira 13”: horror absoluto, ainda mais com sua atual formação conservadora, anti-democrática e caronista.
Devolver autonomia ao processo orçamentário não significa deixar livre o caminho para a intemperança fiscal. Para coroar este novo regime, vamos propor que o equilíbrio fiscal de longo prazo seja um dos princípios constitucionais que deve obrigar a Administração Pública, aprovando-se uma lei complementar de responsabilidade orçamentária em termos que tornem possível à adaptação a circunstâncias excepcionais.
Novo “seis por meia-dúzia” recheado de frases obtidas pela já referida tabelinha. E é muito importante a frase “para coroar este novo regime” – simbolicamente, ela mostra a que veio este programa e a que estão dispostos seus executores.
Finalmente, vamos propor a criação de uma instituição que articule e integre o Poder Executi-vo e o Legislativo, uma espécie de Autoridade Orçamentária, com competência para avaliar os programa públicos, acompanhar e analisar as variáveis que afetam as receitas e despesas, bem como acompanhar a ordem constitucional que determina o equilíbrio fiscal como princípio da administração pública.
Aqui está sugerida a criação de uma autarquia todo-poderosa, um verdadeiro cabide de cargos e nomeações políticas, que terá a mesma atuação da Casa Civil. Aqui se revela a grande falta de coerência do presente programa. Não havia sido dito logo acima, que “os Poderes tem de se entender”? Não havia sido mencionada a “responsabilidade do Legislativo”? Para quê, então, um órgão de controle sobre os Poderes?
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Biiiip. No momento não posso atender. Deixe seu recado após o sinal. Biiiip.