Porque somos uns idiotas.
Porque não reconhecemos que qualquer ato de violência é uma vergonha.
Porque, como dizia George Orwell, todos somos iguais, mas alguns são mais iguais que os outros.
Porque Deus orientou os Evangélicos, por e-mail, a continuarem a cruzada contra essa pouca vergonha (quer dizer, a pouca vergonha sexual entre homens, porque a orgia que se faz entre os homens no Congresso com o nosso dinheiro ainda é permitida).
Porque nem todos têm direitos iguais.
Porque o mundo é melhor assim: repleto de violência, fome, miséria, superpopulação, escassez de água.
Porque estamos mais preocupados com a bolsa Hermés que a Dilma comprou.
Porque estamos acostumados a ver nossa opinião desrespeitada: no orçamento participativo digital de 2008 em Belo Horizonte, o projeto que ganhou pelo voto da população foi o do Bairro Padre Eustáquio (periferia), mas a obra que será realizada mesmo é o anel viário gigante no Belvedere (classe A). Ou seja, é o trânsito de carrões importados que precisa ser desafogado, e não o de ônibus de periferia.
Porque é mais simples enfiar a cabeça na areia.
Porque os gays já sabem se defender: eles "tiram a gilete", eles "rodam a baiana", eles contam pra esposa do político com quantas mocreias ele já se deitou.
Por último: porque não existe, nunca existiu, nem vai existir amor nesse mundo.
ANIMA DECOLORUM EST
quarta-feira, 18 de novembro de 2009
terça-feira, 10 de novembro de 2009
Papo de academia
É um pé no saco. Frequento porque cuido do corpo como uma forma de saúde. Mas é duro de escutar.
Por uma artimanha do destino, frequento uma academia de classe alta. Entro, sou educado principalmente com quem está trabalhando, troco de roupa, malho, gasto calorias, suo, faço condicionamento aeróbico (o último exame deu "Excelente"), faço sauna, me barbeio, tomo uma ducha, visto a roupa, vou embora. Seria ótimo se fosse só isso.
De vez em quando, escuto sem querer as conversas dos homens de classe alta no vestiário ou na sauna. Mais raso e vazio impossível. Não falam nem do último filme do Bruce Willis, quanto mais do concerto chiquérrimo do Nelson Freire. A única coisa que escuto é "Nunca mais vou pro hemisfério norte entre outubro e março", "Já fui duas vezes à África do Sul este ano", "Quando estive em Nova York mês passado trouxe o laptop mais moderno", "Fui à Suiça trocar o Rolex que não funcionava em altas altitudes", "Miami é o paraíso das compras", "Não fui no seu aniversário no (buffet) Catarina porque estava recepcionando uns franceses em Escarpas (do Lago)".
É duro de escutar. Comento para mim mesmo, resignado: "Ah, os valores..." Mas serão valores mesmo, ou a velha história do macho competitivo que, mesmo longe da fêmea, continua mostrando que é o merecedor da liderança do bando?
Uma academia de ginástica é o templo do hedonismo, ou seja, o local ideal para a competição. A cultura é o último dos quesitos de desempate. Imagino que seja o mesmo no vestiário feminino. Daí a pouca profundidade, o parco conteúdo.
É tão surreal que me permito rir. Será que a classe alta é assim o tempo todo, ou ela só é assim no grande templo? Rio e vou colhendo pequenos fragmentos para um futuro livro. Tudo para mim se transforma em tema literário, hoje em dia.
Por uma artimanha do destino, frequento uma academia de classe alta. Entro, sou educado principalmente com quem está trabalhando, troco de roupa, malho, gasto calorias, suo, faço condicionamento aeróbico (o último exame deu "Excelente"), faço sauna, me barbeio, tomo uma ducha, visto a roupa, vou embora. Seria ótimo se fosse só isso.
De vez em quando, escuto sem querer as conversas dos homens de classe alta no vestiário ou na sauna. Mais raso e vazio impossível. Não falam nem do último filme do Bruce Willis, quanto mais do concerto chiquérrimo do Nelson Freire. A única coisa que escuto é "Nunca mais vou pro hemisfério norte entre outubro e março", "Já fui duas vezes à África do Sul este ano", "Quando estive em Nova York mês passado trouxe o laptop mais moderno", "Fui à Suiça trocar o Rolex que não funcionava em altas altitudes", "Miami é o paraíso das compras", "Não fui no seu aniversário no (buffet) Catarina porque estava recepcionando uns franceses em Escarpas (do Lago)".
É duro de escutar. Comento para mim mesmo, resignado: "Ah, os valores..." Mas serão valores mesmo, ou a velha história do macho competitivo que, mesmo longe da fêmea, continua mostrando que é o merecedor da liderança do bando?
Uma academia de ginástica é o templo do hedonismo, ou seja, o local ideal para a competição. A cultura é o último dos quesitos de desempate. Imagino que seja o mesmo no vestiário feminino. Daí a pouca profundidade, o parco conteúdo.
É tão surreal que me permito rir. Será que a classe alta é assim o tempo todo, ou ela só é assim no grande templo? Rio e vou colhendo pequenos fragmentos para um futuro livro. Tudo para mim se transforma em tema literário, hoje em dia.
quinta-feira, 5 de novembro de 2009
Noite de agonia
Uma coisa levou a outra. Estou puto.
Não queria sair com os amigos. Queria pegar o ônibus (moro longe do centro) e ir rápido para casa, mas a cerveja gelada foi tentadora nesse calor. Devia ter seguido meus instintos.
Batata. Depois de finalmente pagar a conta, amarguei quase meia hora de espera no ponto de ônibus. Veio, afinal, bem vazio. Aliviado, me sentei.
Eu havia me esquecido que um jogo de futebol acabara justamente há pouco. Quando o ônibus se preparava para deixar o Centro, mil adolescentes invadiram o ônibus, quebraram a escotilha e uns seis subiram ao teto para "surfar". A agonia estava só começando.
No primeiro ponto da periferia, uma blitz de uns seis carros esperava o ônibus. Atabalhoadamente, os surfistas desceram do teto e tentaram fingir que eram cidadãos comuns. Tarde demais. O ônibus foi parado e os mil adolescentes foram desembarcados e revistados.
Eu só pensava na minha cama.
Meia hora depois, a "turma" embarcou novamente. Um sentimento podre de impotência conseguiu me dominar. Juntei as sacolas que penosamente carregava e desembarquei. Os guardas tentaram me convencer a seguir viagem, mas disse a um deles, textualmente: "você fez um ótimo trabalho, guarda, mas eu não confio nessa turma por nada desse mundo". Peguei um táxi que, por milagre, acabara de desembarcar pasageiros numa rua transversal.
Em dia de jogo de futebol em Belo Horizonte, vou me entocaiar em casa ou, se não conseguir evitar, por nada, por nada mesmo, vou ficar até tarde na rua ou, se a tentação for realmente grande, devo me prevenir com grana para táxi.
O que me enche de raiva é que esses meninos serão os trabalhadores do futuro. Com essa formação, duvido que tenhamos futuro.
Não queria sair com os amigos. Queria pegar o ônibus (moro longe do centro) e ir rápido para casa, mas a cerveja gelada foi tentadora nesse calor. Devia ter seguido meus instintos.
Batata. Depois de finalmente pagar a conta, amarguei quase meia hora de espera no ponto de ônibus. Veio, afinal, bem vazio. Aliviado, me sentei.
Eu havia me esquecido que um jogo de futebol acabara justamente há pouco. Quando o ônibus se preparava para deixar o Centro, mil adolescentes invadiram o ônibus, quebraram a escotilha e uns seis subiram ao teto para "surfar". A agonia estava só começando.
No primeiro ponto da periferia, uma blitz de uns seis carros esperava o ônibus. Atabalhoadamente, os surfistas desceram do teto e tentaram fingir que eram cidadãos comuns. Tarde demais. O ônibus foi parado e os mil adolescentes foram desembarcados e revistados.
Eu só pensava na minha cama.
Meia hora depois, a "turma" embarcou novamente. Um sentimento podre de impotência conseguiu me dominar. Juntei as sacolas que penosamente carregava e desembarquei. Os guardas tentaram me convencer a seguir viagem, mas disse a um deles, textualmente: "você fez um ótimo trabalho, guarda, mas eu não confio nessa turma por nada desse mundo". Peguei um táxi que, por milagre, acabara de desembarcar pasageiros numa rua transversal.
Em dia de jogo de futebol em Belo Horizonte, vou me entocaiar em casa ou, se não conseguir evitar, por nada, por nada mesmo, vou ficar até tarde na rua ou, se a tentação for realmente grande, devo me prevenir com grana para táxi.
O que me enche de raiva é que esses meninos serão os trabalhadores do futuro. Com essa formação, duvido que tenhamos futuro.
Babagamush e Camila Baker
Quatro amigos e um convidado talentosíssimo se divertindo. Só posso começar assim este post. Eu quase que só dava gargalhada por saber que são amigos meus fazendo o que nunca fizeram, pelo menos em público. Digo se divertindo porque muitas das piadas são chistes entre eles, piadas particulares que pouca gente entendia como piada e ria.
Kalluh Araújo deixa mais uma vez sua marca. As gags de repetição e aproveitamento de equívocos dos ensaios vêm desde que trabalhei com ele em Tartufo, há alguns anos. É divertidíssimo, e precisa de bons atores para bem executá-las, mas repeti-las mais vezes do que permite o limite do risível corre o risco de cansar, dar "barriga" no espetáculo, e acho que a única barriga que Camila Baker merece é a do Fernando Veríssimo, impagável como nordestina e com o bordão "pelo menos meu bucho tá cheio".
A melhor cena do espetáculo, pra mim, é a da memória de infância da personagem-título. Pro resto do espetáculo, o que eu acho que faltou foi justamente estender para as outras a energia deliciosa desta cena. Se a intenção é o "falso canastrão" novelesco, farsesco, acho a técnica ótima, mas acho que uma dosagem sempre alta cansa . Achei o figurino muito bacana, no limite do brega, colorido e acetinado. Achei a trilha sonora bem bacana, também.
Eu reduziria 20minutos do espetáculo, acho que ficaria redondinho e bem mais gostoso de assistir.
Kalluh Araújo deixa mais uma vez sua marca. As gags de repetição e aproveitamento de equívocos dos ensaios vêm desde que trabalhei com ele em Tartufo, há alguns anos. É divertidíssimo, e precisa de bons atores para bem executá-las, mas repeti-las mais vezes do que permite o limite do risível corre o risco de cansar, dar "barriga" no espetáculo, e acho que a única barriga que Camila Baker merece é a do Fernando Veríssimo, impagável como nordestina e com o bordão "pelo menos meu bucho tá cheio".
A melhor cena do espetáculo, pra mim, é a da memória de infância da personagem-título. Pro resto do espetáculo, o que eu acho que faltou foi justamente estender para as outras a energia deliciosa desta cena. Se a intenção é o "falso canastrão" novelesco, farsesco, acho a técnica ótima, mas acho que uma dosagem sempre alta cansa . Achei o figurino muito bacana, no limite do brega, colorido e acetinado. Achei a trilha sonora bem bacana, também.
Eu reduziria 20minutos do espetáculo, acho que ficaria redondinho e bem mais gostoso de assistir.
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