Então, em pleno inverno, lançamos o que vai estar usando no verão.
Desde sempre, de vez em quando eu presto atenção a conversas femininas relacionadas à moda - no caso, a moda das sacoleiras, em nada comparado ao "preço sob consulta" das páginas da Vogue - e, volta e meia, vinha delas essa frase: "Isso é o que vai estar usando". Ok, beleza. Quem "vai estar usando"? Quem "vai estar usando" o quê? A frase se tornou genérica para as tendências da próxima estação, pelo menos entre as sacoleiras. Só que este não é o ponto de vista pelo qual eu analiso a moda: meu negócio é a política do negócio.
Meu projeto de graduação na escola superior de design foi sobre a história da moda. Foi um mergulho muito interessante nesse fenômeno. A trajetória da roupa, se fosse acompanhada por um lápis sobre um papel, faria o desenho de uma longa onda senoidal: uma tendência surge (a parte baixa da onda), vai crescendo, chega a um ápice (ou exagero) e decresce até sumir e ser substituída por outra. A explicação para isso deve retroceder nos séculos. Desde que ultrapassou o conceito de proteção ao frio, a roupa significa status, uma forma de organizar a sociedade, dividindo-a para que fosse mais fácil administrá-la. Hoje, a necessidade de divisão para melhor aplicação da democracia (ô piada...) não existe porque o conceito grego de democracia há muito se perdeu: hoje a roupa divide as classes pelo poder de compra. Antes, só um nobre possuía recursos suficientes para colorir uma túnica; hoje, estampa-se dois C's cruzados em uma haste de óculos apenas para se dizer "eu posso, você não pode".
Ver uma mulher usando uma sandália simplesmente horrorosa só porque ela leva o label de Fulano é muito triste, demonstra falta de personalidade ou, em última instância, baixa auto-estima, o que eu acho que as mulheres não merecem, nunca mereceram.
A mulher (e o homem, claro) que sabe onde fica o seu ponto G (de Glamour) não embarca nessa de "vai estar usando". Para ela (ele), no fundo, é que os grandes criadores trabalham. Só que o que é apresentado em passarelas, os conceitos que vão valorizar a marca no mercado (sobre esse assunto eu não gostaria de falar) e que são o lado escuro da moda, são pasteurizados à exaustão para serem vendidos aos montes nas grandes magazines e engolidos pela massa sem qualquer raciocínio crítico. Ver uma mulher de curvas renascentistas tentando caber no corpete que foi usado pela Bündchen é antes de tudo trágico.
E a Semana de Moda de São Paulo termina com mais um balde de conceitos para as sacoleiras faturarem com "o que vai estar usando". É nessas horas que eu me lembro da Beth Lago, tão superior a isso tudo, dona de seu próprio estilo e sabendo muito bem onde fica o Ponto G dela: os puro-sangues estão, definitivamente, em extinção.
ANIMA DECOLORUM EST
quinta-feira, 26 de junho de 2008
quarta-feira, 25 de junho de 2008
Sou poodle, sim. Vai encarar?
Nossos bons exemplos vêm todos da natureza. Os exemplos ruins, acho que a grande maioria, ô raça essa nossa para aprender rápido o que não presta, vêm da chamada pirâmide social, e acredito que este fenômeno não seja apenas no sentido de cima para baixo: é também o contrário, tem muita madame balançando os quadris ao som de Tati Quebra-Barraco.
A persistência, a criatividade, a harmonia em sociedade, o trabalho para um bem comum, a alegria, o companheirismo, são todos exemplos que aprendemos observando animais, insetos, plantas e os fenômenos naturais, e olha que isso não é novo: o I Ching sintetizou essa observação há pelo menos 2000 anos. Entre filósofos, a isso se dá o nome de Empirismo.
Ainda há coisas a aprender com a natureza, fenômenos para os quais há pouco tempo estamos nos dando conta. Um exemplo é a necessidade de renovação, de sustentabilidade, coisas que a natureza tem tentado nos ensinar há muito tempo. O outro é a lealdade, fenômeno que pode nos colocar acima de quaisquer forças.
Juro que fiquei emocionado ao ver a foto do poodle que enfrentou uma besta para defender seu território - não, eu não me iludo em achar que ele estava defendendo a família, ele estava defendendo uma conquista. Ele obteve direito legítimo sobre aquele espaço ao demonstrar alegria, companheirismo, inteligência, simpatia e gratidão à família que o acolheu. Eu tenho duas fêmeas em casa, e estou falando de cadeira. E a lealdade daquele cão àquela conquista foi realmente emocionante, sabe-se lá de onde aquela coisinha mignon tirou forças para enfrentar uma mordedura de 120 toneladas!
Que tal se aplicássemos o exemplo em quem nos oprime pelo poder da força? É bom que saibamos que a natureza está nos mostrando que a força bruta já não pode ser considerada sinônimo de poder. Existem outras coisas mais poderosas que o músculo do punho e a arma que ele segura.
A persistência, a criatividade, a harmonia em sociedade, o trabalho para um bem comum, a alegria, o companheirismo, são todos exemplos que aprendemos observando animais, insetos, plantas e os fenômenos naturais, e olha que isso não é novo: o I Ching sintetizou essa observação há pelo menos 2000 anos. Entre filósofos, a isso se dá o nome de Empirismo.
Ainda há coisas a aprender com a natureza, fenômenos para os quais há pouco tempo estamos nos dando conta. Um exemplo é a necessidade de renovação, de sustentabilidade, coisas que a natureza tem tentado nos ensinar há muito tempo. O outro é a lealdade, fenômeno que pode nos colocar acima de quaisquer forças.
Juro que fiquei emocionado ao ver a foto do poodle que enfrentou uma besta para defender seu território - não, eu não me iludo em achar que ele estava defendendo a família, ele estava defendendo uma conquista. Ele obteve direito legítimo sobre aquele espaço ao demonstrar alegria, companheirismo, inteligência, simpatia e gratidão à família que o acolheu. Eu tenho duas fêmeas em casa, e estou falando de cadeira. E a lealdade daquele cão àquela conquista foi realmente emocionante, sabe-se lá de onde aquela coisinha mignon tirou forças para enfrentar uma mordedura de 120 toneladas!
Que tal se aplicássemos o exemplo em quem nos oprime pelo poder da força? É bom que saibamos que a natureza está nos mostrando que a força bruta já não pode ser considerada sinônimo de poder. Existem outras coisas mais poderosas que o músculo do punho e a arma que ele segura.
domingo, 22 de junho de 2008
Em defesa de João Emanuel Carneiro
Eu não costumo acompanhar novelas. Geralmente estou muito cansado após o dia de trabalho, e depois do jantar prefiro a companhia de meu computador e minhas palavras. As novelas são sempre as mesmas - a disputa pelo poder nas empresas Tal, as ações que mudam de mão, os golpes para chegar à diretoria, a investigação pelo assassinato de Fulano, as mulheres que passam do mocinho para o vilão e vice-versa. Só mudam os nomes dos personagens e, é óbvio, os atores que os interpretam. Por isso, para saber como uma novela vai seguir, para mim basta que eu assista o primeiro capítulo de uma, no máximo o segundo. Ali os personagens são apresentados, a trama se desenha e, para mim, já conta como vai ser o final. O resto eu acompanho pelas capas das revistas de fofoca.
Assim como os livros, se uma história não "pega" para mim no primeiro capítulo, eu a abandono sem constrangimentos. Para mim, são as "merdas literárias" às quais já me referi. Por esse motivo, cansado de ver repeteco de temas e tramas nos folhetins televisivos, já não me importo mais com eles. É a mesma coisa desde Brilhante (1981, Gilberto Braga), salvo raríssimas exceções (Guerra dos Sexos, 1985, Silvio de Abreu, Roque Santeiro, 1986, Dias Gomes, e Que Rei sou Eu, 1989, Silvio de Abreu) e, sinceramente, tenho mais a fazer com o meu tempo do que ver coisas repetidas.
Ibope não me interessa. Me interessa é saber se o texto é bacana ou, no máximo, se a trama está sendo bem conduzida ou, também, se os atores estão trabalhando bem. Mas tem uma novela que me "pegou" no primeiro capítulo, o texto, mesmo versando sobre uma trama repetida, é excepcional, e os atores são irrepreensíveis. Pela primeira vez em anos, eu me interessava por um folhetim do horário nobre, estava vendo frescor naquele texto que permitia aos atores exercitarem o que neles havia de melhor.
E eis que o Ibope sugere mudanças no folhetim, pelos baixíssimos pontos que a novela alcançou. E eis aí o motivo desta postagem.
Não concordo com a interferência na trama do João Emanuel Carneiro. Não acho que ele deva ser punido pelo fato do folhetim não ter caído no gosto do brasileiro. Só que estamos falando de arte (o texto, a direção de arte e a interpretação dos atores), e novela é, infelizmente, business. Novela em horário nobre pouco assistida perde valor de mercado, o valor por segundo do espaço comercial cai muito, e o lucro esperado de vinte milhões corre o sério risco de cair para dezenove, o que seria um absurdo. Por isso, e somente por isso, a novela deve sofrer interferência. É uma grande pena.
Discutir gosto é saudável. Torna a gente capaz de comparar as coisas. Mas não é surpreendente que a primeira novela em anos a me "pegar" desde o primeiro capítulo, aquela na qual vi algo que a diferenciasse das outras em qualidade e possibilidades, seja justamente aquela que está batendo recordes negativos de aceitação pública? Será que o público só consegue digerir o mesmo cardápio? Alergia a elementos novos? Sei não. Que ciclo vicioso será este?
Novelas são um meio eficaz de se avaliar o que as pessoas estão pensando, sejam elas da alta classe média, aquela que toma as decisões, ou da baixa classe média, aquela que aponta as tendências do Ibope. No caso do "bom gosto" do público, poderíamos tirar o "I", não acham?
Assim como os livros, se uma história não "pega" para mim no primeiro capítulo, eu a abandono sem constrangimentos. Para mim, são as "merdas literárias" às quais já me referi. Por esse motivo, cansado de ver repeteco de temas e tramas nos folhetins televisivos, já não me importo mais com eles. É a mesma coisa desde Brilhante (1981, Gilberto Braga), salvo raríssimas exceções (Guerra dos Sexos, 1985, Silvio de Abreu, Roque Santeiro, 1986, Dias Gomes, e Que Rei sou Eu, 1989, Silvio de Abreu) e, sinceramente, tenho mais a fazer com o meu tempo do que ver coisas repetidas.
Ibope não me interessa. Me interessa é saber se o texto é bacana ou, no máximo, se a trama está sendo bem conduzida ou, também, se os atores estão trabalhando bem. Mas tem uma novela que me "pegou" no primeiro capítulo, o texto, mesmo versando sobre uma trama repetida, é excepcional, e os atores são irrepreensíveis. Pela primeira vez em anos, eu me interessava por um folhetim do horário nobre, estava vendo frescor naquele texto que permitia aos atores exercitarem o que neles havia de melhor.
E eis que o Ibope sugere mudanças no folhetim, pelos baixíssimos pontos que a novela alcançou. E eis aí o motivo desta postagem.
Não concordo com a interferência na trama do João Emanuel Carneiro. Não acho que ele deva ser punido pelo fato do folhetim não ter caído no gosto do brasileiro. Só que estamos falando de arte (o texto, a direção de arte e a interpretação dos atores), e novela é, infelizmente, business. Novela em horário nobre pouco assistida perde valor de mercado, o valor por segundo do espaço comercial cai muito, e o lucro esperado de vinte milhões corre o sério risco de cair para dezenove, o que seria um absurdo. Por isso, e somente por isso, a novela deve sofrer interferência. É uma grande pena.
Discutir gosto é saudável. Torna a gente capaz de comparar as coisas. Mas não é surpreendente que a primeira novela em anos a me "pegar" desde o primeiro capítulo, aquela na qual vi algo que a diferenciasse das outras em qualidade e possibilidades, seja justamente aquela que está batendo recordes negativos de aceitação pública? Será que o público só consegue digerir o mesmo cardápio? Alergia a elementos novos? Sei não. Que ciclo vicioso será este?
Novelas são um meio eficaz de se avaliar o que as pessoas estão pensando, sejam elas da alta classe média, aquela que toma as decisões, ou da baixa classe média, aquela que aponta as tendências do Ibope. No caso do "bom gosto" do público, poderíamos tirar o "I", não acham?
quinta-feira, 19 de junho de 2008
O Gene da Aberração
A gente evoluiu muito pouco desde a Idade das Cavernas. Acredito que o que nos separa daqueles camaradas que literalmente matavam touros à unha é apenas a falta de pêlos. Nós ainda somos os mesmos que pagavam um óbolo para ver cristãos serem devorados por leões, para ver gladiadores lutando até à morte. Nossa assim chamada evolução é apenas tecnológica.
Ou seja, fazemos as mesmas coisas de sempre, só que desta vez não precisamos ir a estádios e anfiteatros: basta ligar a tevê, e a catarse está ali.
Não vai adiantar nenhum filósofo humanista argumentar o contrário: a violência está em nosso DNA. Ela faz parte daquele conjunto de características genéticas herdadas de nossos antepassados australopitecus, junto com as sobrancelhas e o apêndice. Ela também é conseqüência daquela outra característica genética, a competição: quem tem mais poder conquista a fêmea mais parideira. E o poder, para ser mantido, usa de todos os meios.
Quero lembrar que há bem pouco tempo queimávamos, enforcávamos e decapitávamos pessoas em praça pública. Se havia a coragem de se fazer isso em público, imagine-se o que não acontecia nos porões, onde o decoro devia impedir de exibir-se o tratamento que os suspeitos de bruxaria ou conspiração sofriam para confessar. Não faz muito tempo aqui, no Brasil, mais precisamente em duas cidades de Minas Gerais, usamos de curiosos meios para demonstrar poder sobre as pessoas: um camarada foi arrastado por cavalos a galope pelas ruas de pedra até que apenas pedaços das pernas ficassem pendurados nas cordas. O outro foi amarrado a quatro cavalos, e cada um saiu em disparada em uma direção diferente. O chefe destes dois foi enforcado, esquartejado e exposto em praça pública, para exibição de sua "ignomínia". As pessoas comuns - gente como nós - passavam em frente e ainda cuspiam.
Um dia, alguém escreveu um livro, divulgou idéias, formou um grupo de estudo, sei lá, e levantou a hipótese de que esta barbárie era uma coisa má, errada: alguém esticou o pescoço acima da multidão e começou a perceber que devíamos evoluir também nessa parte. Outro inventou a Era de Aquário, e se baseou no movimento dos astros - matemática complicada porque superior à compreensão humana - para corroborar a hipótese do camarada.
Com esses movimentos, a violência, tão comum e corriqueira na sociedade, viu-se acuada ao proibido, ao punível, e foi obrigada a atuar nos planos sub-reptícios, no escuro escondido porque, sendo parte do DNA humano, não tinha escapatória senão existir.
E, com o aprendizado de alguns milênios de barbárie, a violência foi se sofisticando. O gama de opções e níveis de brutalidade hoje disponível impressiona, e olha que a violência ainda está em processo de sofisticação: a cada dia nos deparamos com novas idéias surgidas lá no fundo, naquela nano-minúscula usina chamada DNA.
A nova modalidade é fingir que não está acontecendo. Uma menina passa seis dias sendo estuprada numa cela de trinta homens, e a atenção do país todo se volta pro cara que, numa explosão de stress (a violência tem de sair por algum poro), joga a filha pela janela. Há alguma diferença? De barbárie, não. De poder, sim. A flying girl era de classe média alta em São Paulo. A mini-gradisca mora no interior do Pará e precisa comer muito feijão pra chegar ao nível da classe Z. Fingimos que a mini-gradisca não existe, porque a flying girl é mais importante.
E o filme Tropa de Elite faz sucesso porque fingimos que aquilo é só um filme pra subir um pouco nossa adrenalina. E fingimos que era aquilo mesmo que aqueles tenentes deviam fazer: colocar os cristãos pra gente ver os leões comerem. E aí esperamos o jornal acabar pra assistir a novela.
E aí? Vamos dar a outra face? Vamos nos ving... ops, quer dizer, fazer justiça? Prender os soldados romanos que nos proporcionaram o espetáculo vendido a meio óbolo, patrocinado pelas Casas A e pelas Drogarias B? Isso vai fazer a violência e o desprezo pela criatura humana sair de seus DNA's? Não, não vai, e o debate deixo no ar, pois esse tipo de discussão vai muito além de um modesto blog.
A selva deixou de ser vegetal: agora é de concreto. A luta diária passa muito longe de ser apenas por comida e o conforto do lar: agora precisamos rezar para chegar vivos ao fim acolhedor do dia.
É triste? É. Mas não está muito diferente do que aconteceu há... alguns milhares de anos atrás.
Falar em primitivo: que babado esse da São Paulo Fashion Week, hein? Engraçado, quando a Lílian Pacce fala dos eventos estrangeiros, é Semana de Moda. Aqui, em português, é Fashion Week! Quaquaraquaquá!!!
Ou seja, fazemos as mesmas coisas de sempre, só que desta vez não precisamos ir a estádios e anfiteatros: basta ligar a tevê, e a catarse está ali.
Não vai adiantar nenhum filósofo humanista argumentar o contrário: a violência está em nosso DNA. Ela faz parte daquele conjunto de características genéticas herdadas de nossos antepassados australopitecus, junto com as sobrancelhas e o apêndice. Ela também é conseqüência daquela outra característica genética, a competição: quem tem mais poder conquista a fêmea mais parideira. E o poder, para ser mantido, usa de todos os meios.
Quero lembrar que há bem pouco tempo queimávamos, enforcávamos e decapitávamos pessoas em praça pública. Se havia a coragem de se fazer isso em público, imagine-se o que não acontecia nos porões, onde o decoro devia impedir de exibir-se o tratamento que os suspeitos de bruxaria ou conspiração sofriam para confessar. Não faz muito tempo aqui, no Brasil, mais precisamente em duas cidades de Minas Gerais, usamos de curiosos meios para demonstrar poder sobre as pessoas: um camarada foi arrastado por cavalos a galope pelas ruas de pedra até que apenas pedaços das pernas ficassem pendurados nas cordas. O outro foi amarrado a quatro cavalos, e cada um saiu em disparada em uma direção diferente. O chefe destes dois foi enforcado, esquartejado e exposto em praça pública, para exibição de sua "ignomínia". As pessoas comuns - gente como nós - passavam em frente e ainda cuspiam.
Um dia, alguém escreveu um livro, divulgou idéias, formou um grupo de estudo, sei lá, e levantou a hipótese de que esta barbárie era uma coisa má, errada: alguém esticou o pescoço acima da multidão e começou a perceber que devíamos evoluir também nessa parte. Outro inventou a Era de Aquário, e se baseou no movimento dos astros - matemática complicada porque superior à compreensão humana - para corroborar a hipótese do camarada.
Com esses movimentos, a violência, tão comum e corriqueira na sociedade, viu-se acuada ao proibido, ao punível, e foi obrigada a atuar nos planos sub-reptícios, no escuro escondido porque, sendo parte do DNA humano, não tinha escapatória senão existir.
E, com o aprendizado de alguns milênios de barbárie, a violência foi se sofisticando. O gama de opções e níveis de brutalidade hoje disponível impressiona, e olha que a violência ainda está em processo de sofisticação: a cada dia nos deparamos com novas idéias surgidas lá no fundo, naquela nano-minúscula usina chamada DNA.
A nova modalidade é fingir que não está acontecendo. Uma menina passa seis dias sendo estuprada numa cela de trinta homens, e a atenção do país todo se volta pro cara que, numa explosão de stress (a violência tem de sair por algum poro), joga a filha pela janela. Há alguma diferença? De barbárie, não. De poder, sim. A flying girl era de classe média alta em São Paulo. A mini-gradisca mora no interior do Pará e precisa comer muito feijão pra chegar ao nível da classe Z. Fingimos que a mini-gradisca não existe, porque a flying girl é mais importante.
E o filme Tropa de Elite faz sucesso porque fingimos que aquilo é só um filme pra subir um pouco nossa adrenalina. E fingimos que era aquilo mesmo que aqueles tenentes deviam fazer: colocar os cristãos pra gente ver os leões comerem. E aí esperamos o jornal acabar pra assistir a novela.
E aí? Vamos dar a outra face? Vamos nos ving... ops, quer dizer, fazer justiça? Prender os soldados romanos que nos proporcionaram o espetáculo vendido a meio óbolo, patrocinado pelas Casas A e pelas Drogarias B? Isso vai fazer a violência e o desprezo pela criatura humana sair de seus DNA's? Não, não vai, e o debate deixo no ar, pois esse tipo de discussão vai muito além de um modesto blog.
A selva deixou de ser vegetal: agora é de concreto. A luta diária passa muito longe de ser apenas por comida e o conforto do lar: agora precisamos rezar para chegar vivos ao fim acolhedor do dia.
É triste? É. Mas não está muito diferente do que aconteceu há... alguns milhares de anos atrás.
Falar em primitivo: que babado esse da São Paulo Fashion Week, hein? Engraçado, quando a Lílian Pacce fala dos eventos estrangeiros, é Semana de Moda. Aqui, em português, é Fashion Week! Quaquaraquaquá!!!
quarta-feira, 18 de junho de 2008
Minhas regras, meu blog
Não vou - e nem tenho tanta paciência assim - pesquisar em todos os blogs de generalidades para ter uma idéia de seu perfil. Por outro lado, se um blog assim é quase uma busca por autoconhecimento, por que não fazer do jeito que eu acho melhor? Não vou iludir os leitores fingindo que não estou buscando o sucesso - apenas quero fazer sucesso sem seguir fórmulas, o que reconhecidamente é difícil.
Não vou me expor, também. Não acho que os leitores mereçam conhecer minhas entranhas doloridas. Já há muito sofrimento no mundo, não vou contribuir. Vou postar minhas delícias, acho que a felicidade, ao contrário do sofrimento, deva ser espalhada e estimulada nos outros. Minhas raivas-contra-a-máquina eu vou postar sim, faz parte do meu ser político. Mas não vou postar minha raiva contra o motorista que fechou o meu carro, vou postar apenas uma prece para que o trânsito seja menos dinossauro.
Humor. Adoro. Adoro a gargalhada, e no que eu puder vou estimulá-la.
O tema geral é generalidades (já deu pra perceber que adoro trocadilhos?), mas o perfil do blog vai se estabelecer aos poucos. Não vou fixar um agora, vou percebê-lo lá pela milésima postagem. Além do mais, as críticas serão muito importantes nesse processo.
Uma coisa eu já posso dizer: esse troço vicia. Dá vontade de ficar postando o tempo todo, mil idéias passam pela cabeça, nenhuma se fixa, e a endorfina que vem de ter uma coisa publicada é o grande barato. Taqueuspa.
No mais, como na cena final de Working Girl (1985), na fala de Melanie Griffith: a gente (eu e vocês, leitores) vai se descobrindo aos poucos.
Abraços
Não vou me expor, também. Não acho que os leitores mereçam conhecer minhas entranhas doloridas. Já há muito sofrimento no mundo, não vou contribuir. Vou postar minhas delícias, acho que a felicidade, ao contrário do sofrimento, deva ser espalhada e estimulada nos outros. Minhas raivas-contra-a-máquina eu vou postar sim, faz parte do meu ser político. Mas não vou postar minha raiva contra o motorista que fechou o meu carro, vou postar apenas uma prece para que o trânsito seja menos dinossauro.
Humor. Adoro. Adoro a gargalhada, e no que eu puder vou estimulá-la.
O tema geral é generalidades (já deu pra perceber que adoro trocadilhos?), mas o perfil do blog vai se estabelecer aos poucos. Não vou fixar um agora, vou percebê-lo lá pela milésima postagem. Além do mais, as críticas serão muito importantes nesse processo.
Uma coisa eu já posso dizer: esse troço vicia. Dá vontade de ficar postando o tempo todo, mil idéias passam pela cabeça, nenhuma se fixa, e a endorfina que vem de ter uma coisa publicada é o grande barato. Taqueuspa.
No mais, como na cena final de Working Girl (1985), na fala de Melanie Griffith: a gente (eu e vocês, leitores) vai se descobrindo aos poucos.
Abraços
terça-feira, 17 de junho de 2008
As coisas em que acredito
Olá. Sejam bem-vindos ao meu blog. Finalmente, depois de muito assuntar, resolvi me jogar na blogosfera, espaço que já tem até estudo acadêmico a respeito. O nome do blog vem do meu perfil no orkut, em que coloco a seguinte frase: "Tenho opinião formada sobre tudo, sim: por isso é que sou essa metamorfose ambulante". Aqui nesse espaço vou colocar minha opinião e, quem sabe, publicar um romance que estou escrevendo, tipo novela das antigas, aquelas que eram publicadas em jornais e que multiplicavam por cem as tiragens dos jornais das décadas de 50.
Este primeiro post é um texto que escrevi no início do ano, um desabafo contra a porcaria bestificante que grassa por esse mundo-de-alice que é a internet.
FILTRO DE E-MAIL ou AS COISAS EM QUE ACREDITO
Caros amigos,
Resolvi escrever este texto diante do monte de e-mails que recebo, e olha que, dentre as pessoas que conheço, sou uma das que recebem menos. Pra começar, me perdoem se o texto ficar longo ou enfadonho demais, eu me esforço bastante para escrever do jeito menos desagradável possível, só que não tem jeito, falar de muitas coisas demandam esforço e paciência, o que encarecidamente peço de vocês neste momento.
As causas que me motivaram a este texto são várias, mas principalmente pela insistência da repetição de alguns tipos de e-mail que as pessoas acham que eu mereço receber, e a mensagem principal deste desabafo é: não, eu não mereço. Então, resolvi listar algumas coisas em que acredito para que, no futuro, o volume de e-mails que recebo passe por um incremento qualitativo, e o nível de amizade continue o mesmo. Se o que vocês leram até agora é o suficiente, podem parar de ler e passar para o próximo e-mail, não se sintam obrigados a ir até o fim.
Eu acredito neste país e no governante dele. Acredito que, a despeito de qualquer coisa risível que tenha feito em seu passado ou que esteja fazendo no presente, Luís Inácio Lula da Silva está fazendo um esforço enorme para que o Brasil ande com as próprias pernas. E acredito em Lula como acreditei em Fernando Henrique Cardoso e em Itamar Franco. Os três fizeram esforços hercúleos para colocar o país nos eixos, pois acredito que o Brasil, se estivesse ainda nas mãos de quem apoiou e votou em Fernando Collor(mesmo sabendo que Itamar foi vice dele), já teria virado um imenso e ingovernável Haiti, onde a classe média se refugia em seus feudos pintados de branco e deixam que os famintos se digladiem. Acredito que o problema principal de meu país esteja no jogo de interesses políticos que não levam nada em consideração a não ser a manutenção do poder e do dinheiro em poucas mãos. Se Lula está metido em coisas escusas, acredito que ele não é o primeiro e não será o único que montou uma máscara de coitadinho para chegar ao poder, mas não será por isso que vou deixar de acreditar nas coisas boas que vejo que ele está fazendo. Portanto, não mereço e-mails que envolvam o Presidente do meu país, seja ele Lula ou FHC. Como exemplo: recebi por e-mail, recentemente, uma foto do Luís Inácio da Silva feita para registro no DOPS, o Departamento de Ordem Pública e Social criado no governo dos militares, em meio a outras fotos curiosas de coisas que só acontecem em certos países. Mensagem implícita na foto: “só no Brasil acontece que alguém com passagem pelo DOPS chegue a presidente”. Bem, informação é muito importante: TODAS as cabeças pensantes deste país têm um registro no DOPS: Austregésilo de Athayde, o lendário presidente da Academia Brasileira de Letras; Fernando Gabeira; José Celso Martinez Corrêa; José Mindlin; Chico Buarque, Caetano Veloso e Gilberto Gil;Oscar Niemeyer; Danuza Leão; e não vou duvidar se FHC também tiver a sua. Naquela época, todo mundo que discordava dos militares era bandido. Por outro lado, coisas muito mais graves só aconteceram em outros países: um ator cowboy chegou à presidência dos EUA; um ganhador do concurso Mr. Universo chegou ao governo da Califórnia (EUA); um assassino chegou à presidência da Iugoslávia; um louco chegou à presidência da Alemanha; um sádico chegou à presidência do Chile, e idiotas governaram o Afeganistão por mais de quinze anos. Em outras palavras: me sinto privilegiado por haver nascido neste país e nesta época, e por isso valorizo muito minha condição de brasileiro do século XXI, e sou um ser político, pensante, observador, e de excelente memória.
Sou um leitor compulsivo. Leio obras primas e grandes merdas literárias, todas elas receberam meus respeitos. Sou um grande apaixonado pela língua portuguesa, uma das mais belas e sonoras do mundo. Não tenho nenhuma preguiça ou pressa de ler, e ler bem. Acredito que quem lê muito rápido consegue apenas conhecer o geral de uma obra. Pra mim, ler rápido é o oposto de ler com prazer. Lendo com prazer eu guardo informações preciosas acerca das obras, de seu autor, se é livro de estréia, em que contexto foi escrito, etc. Por essas – e outras – questões, não mereço e-mails escritos para serem lidos de forma rápida, assim:
Pq serah q vc naum pd scrvr komu gnt nrml? Hauhihihiuahaihuouiahhoho!!
Sinceramente, acredito que este tipo de escrita, típica do adolescente pós-moderno, é o assassinato formal da língua, de qualquer língua. É funcional entre eles, os adolescentes, e é até engraçado observar que essa nova-língua escrita está passando rapidamente para a língua falada, ou seja, estamos diante do nascimento de um novo dialeto, mas que isso seja boa notícia lá pras negas deles, pra mim não é. Bill Watterson, genial criador dos quadrinhos da dupla Calvin & Haroldo, resumiu bem a questão: “achar engraçado não significa aprovar”.
Ainda no assunto literatura: acredito que nem metade dos textos edificantes, estimulantes no ponto de vista espiritual é de real autoria de quem assina. Já houve o cúmulo de me mandarem um texto de Carlos Drummond de Andrade no qual se falava de internet e celular. Aquilo foi um acinte à minha inteligência, pois Drummond faleceu oito ou dez anos antes do surgimento destas tecnologias. Psicografado? Talvez, mas eu acredito que Chico Xavier e seus seguidores sérios sejam bem parcimoniosos quanto a este tipo de divulgação. Assim, não mereço receber e-mails com frases edificantes assinadas por pessoas famosas. Mereço apenas as frases edificantes, já vou ficar muito agradecido à pessoa que enviou. E-mails em que as letrinhas ficam pingando ao som de Richard Clayderman eu até suporto, tirando o som e dando page-down como quem joga vídeo-game.
Não acredito que Deus, Jesus ou Nossa Senhora Aparecida já tenham acessado a internet, mas seus seguidores já, e por isso orações e suas variantes, como desejos de saúde e prosperidade, honra e contentamento, são sempre bem-vindas. Acredito que a religião (ou a abstenção) deva ser um ato pessoal, intransferível e inviolável. Por isso, mensagens do tipo “o meu Deus é melhor que o seu”, para mim, são menos que lixo. Além disso, não mereço receber ordens do tipo “reze para seu anjo do dinheiro que você será recompensado”. Não, eu não vou fazer isso porque eu não transformo o dinheiro em deus. É ele que me serve, não o contrário. Se eu não tenho muito dinheiro agora, eu estou trabalhando para isso, e aí, sim, os anjos do trabalho e da saúde têm me valido bastante.
Todas as correntes “sérias” e “verdadeiras” morrem na minha caixa de e-mails. Os motivos são vários. Em primeiro lugar, não acredito nelas. Também não me sinto nem um pouco ameaçado por aquelas que me proíbem de cortar “o fluxo”, faço isto desde quando elas eram via carta de papel, e nunca aconteceu o que elas prediziam, seja para o bem, seja para o mal. Além disso, acredito que minha vida real é bem mais interessante que a virtual, e por isso não vou colocar a primeira para ser julgada pela segunda. Não mereço ter o meu nível de amizade por outra pessoa julgado por uma máquina, por exemplo. Sou mais inteligente que isso. Portanto, não vou enviar e-mails para vinte pessoas e esperar a resposta de quem é meu amigo de verdade. A amizade eu testo olhando nos olhos. Não vou enviar e-mails para que a Joaninha Tadinha ganhe a sua cadeira de rodas de presente da Samsung. Assim como eu não mereço receber coisas deste tipo, acredito que meus amigos também não. O mesmo vale para correntes de boicote. O mais recente que recebi foi um convite ao boicote à Petrobras para impedir que a empresa aumente o preço da gasolina. Outra vez, informação é importante: quem aumenta a gasolina é a Agência Reguladora do setor, e ela responde não só pela Petrobras, mas por todas as outras distribuidoras de gasolina. É um caso a se pensar, só que desta vez a desconfiança também é importante: e se esse boicote foi proposto e programado pela concorrência da Petrobras, a saber as multinacionais Texaco e Shell, para que com isso elas abocanhem fatias maiores do mercado brasileiro, em franca expansão, e mandem nosso suado dinheirinho para encher o rabo de americano que não tem mais onde enfiar dólar? O referido e-mail é muito bem escrito e é convincente, mas só para quem não tem a postura política de observar, memorizar e utilizar a informação correta. Não sei de onde tiraram informações de preços de gasolina da Venezuela, mas o texto escamoteia coisas importantes que nem sempre estão visíveis para analfabetos políticos. Este tipo de corrente nunca foi séria o suficiente para que eu dê crédito, e isso é triste, pois acredito que pessoas desonestas estragaram um meio quase perfeito de mobilização popular justamente por ser imenso, altamente anônimo e coberto de impunidade, prato cheio para hipócritas oportunistas. Exceção: quando eu realmente conheço a pessoa ou o objeto da corrente em questão, eu assino embaixo, mas isso aconteceu apenas uma vez, e olha que tenho e-mail há dez anos.
Gosto e mereço receber fotos de trabalhos artísticos (me mandaram um com esculturas feitas com lápis de cor que são um deslumbre), fotos de viagens (tenho amigos e parentes que viajam bastante e me brindam com suas aventuras deliciosas), textos de próprio punho, de preferência que comecem com um “oi, meu amigo, que saudade de você!”, curiosidades do YouTube e textos edificantes. Leio todos, descarto os que não me agradam, e sigo em frente. E-mails em cuja caixa de assunto está escrito Fw:Enc:Fw:Fw eu nem abro por acreditar que amigos não devam ser lembrados como parte de um grupo, e sim como um ser único. Recebo, sim, e com muito prazer, e-mails de divulgação de eventos e comunicação de grupos: são informações de interesse comum, e faz parte da democracia disseminar boas informações.
Por fim, peço que me perdoem o extenso desabafo. Se vocês tiveram paciência de chegar até aqui, posso acreditar que o que escrevi chegou em bons olhos, mesmo que não concordem comigo. Para mim, ouvir é mais importante que concordar. Me perdoem também por não me dirigir individualmente a cada um de vocês, amigos, conhecidos, colegas: se eu fizesse assim, eu correria o risco de parecer estar julgando vocês, e não é esta, de forma nenhuma, minha intenção. A amizade, o conhecimento e o coleguismo de vocês são conquistas da minha vida, e acredito que estes bens sejam invioláveis.
Com apreço,
Jader Vinício Corrêa
Primeiro de fevereiro de 2008
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